Haitians Take Arduous Path to Brazil, and Jobs
Published: January 6, 2012
BRASILÉIA, Brazil — Sobre a odisseia que o levou a esta cidade na Amazônia brasileira, Wesley Saint-Fleur só demonstrou um olhar de exaustão e atordoamento.
Meses atrás, ele embarcou em um ônibus no Haiti, antes de pegar um avião na República Dominicana, que pousou primeiro no Panamá e depois no Equador. Lá sua mulher deu à luz ao filho, Isaac, ele contou, balançando o bebê de quatro meses no joelho e mostrando o documento de identificação equatoriano do menino.
Então eles continuaram de ônibus novamente, através do Equador e do Peru. Em seguida, foram a pé até a Bolívia, onde ele e a mulher tiveram as roupas e as economias furtadas pela polícia: 320 dólares em dinheiro.
“Então nós finalmente chegamos ao Brasil, que me dizem está construindo de tudo, estádios, barragens, estradas”, disse o sr. Saint-Fleur, 27, um operário da construção, um de centenas de haitianos que se juntam todos os dias em torno da praza cheia de palmeiras de Brasiléia. “Tudo o que eu quero é trabalhar e o Brasil, graças a Deus, tem empregos para nós”.
Apostando tudo, milhares de haitianos fizeram este caminho através das Américas para atingir pequenas cidades da Amazônia brasileira no ano passado, numa busca desesperada por trabalho. Houve a chegada de centenas em dias recentes, em meio a temores de que o governo brasileiro terá de reduzir o fluxo antes que as autoridades locais não dêem mais conta de recebê-los.
Suas jornadas improváveis — dos destroços de suas casas na ilha a esses lugares remotos da Amazônia — dizem muito sobre as difíceis condições econômicas que persistem no Haiti dois anos depois do terremoto, mas também sobre o crescente poderio econômico do Brasil, que está se tornando rapidamente um ímã para trabalhadores estrangeiros pobres, mas também para um número crescente de profissionais educados da Europa, dos Estados Unidos e da América Latina.
Ao chegar neste e em outros pontos da fronteira, os haitianos recebem vacinas, água limpa e duas refeições por dia das autoridades. Alguns ficam por semanas em Brasiléia e outras cidades antes de receberem vistos humanitários que permitem a eles trabalhar no Brasil.
Mas com o grande número de novos imigrantes, outros não tem tido a mesma sorte. Depois de viajar milhares de quilômetros e superar muitos obstáculos, alguns se juntam em oitopessoas num pequeno quarto de hotel ou acabam dormindo nas ruas, quase revivendo a miséria que esperavam ter deixado para trás.
“Não posso permitir que a tristeza chegue, já que oportunidades virão depois desta fase”, diz Simonvil Cenel, 33, um alfaiate que está esperando o visto e que lidera animados cultos evangélicos para os que ficam no limbo depois de terem enfrentado de tudo para chegar aqui.
Cerca de 4 mil haitianos imigraram para o Brasil desde o terremoto de 2010, em geral passando primeiro pelo Equador, um país mais pobre e com políticas relaxadas de imigração. O Brasil fez uma exceção para os haitianos, em contraste com os que buscam emprego vindos do Paquistão, da Índia e de Bangladesh, que usam as mesmas rotas amazônicas mas são normalmente expulsos.
“O Haiti está se recuperando de um período de crise extrema, e o Brasil está em condições de ajudar essas pessoas”, disse Valdecir Nicácio, uma autoridade de Direitos Humanos do estado do Acre, onde fica Brasiléia. “Antes de chegar aqui, eles ficam à mercê dos traficantes de humanos”, ele disse. “O Brasil é suficientemente grande para absorver os haitianos que querem empregos”.
Com o número de haitianos crescendo fortemente em dias recentes, as autoridades em Brasiléia e Tabatinga, uma cidade fronteiriça do estado do Amazonas, alertam sobre dificuldades para alimentar e hospedar os haitianos enquanto os pedidos de visto são avaliados. Autoridades federais responderam mandando toneladas de comida para os haitianos, que hoje são mais de mil em cada uma das cidades.
Lidar com uma crise imigratória em suas fronteiras é um novo dilema para o Brasil, que até recentemente estava mais preocupado com a saída de seus próprios cidadãos que buscavam oportunidades nos países ricos do que com a chegada de milhares de estrangeiros empobrecidos.
Embora o crescimento econômico tenha se reduzido recentemente no Brasil, o desemprego permanece em um nível historicamente baixo de 5,2% e muitas companhias encontram dificuldades para encontrar trabalhadores e preencher vagas. Os salários também subiram para os que ocupam os níveis mais baixos do mercado de trabalho, com a renda dos brasileiros pobres subindo sete vezes mais que a renda dos brasileiros ricos entre 2003 e 2009.
“Estamos experimentando um declínio em nossa força de trabalho porque muitos brasileiros vão trabalhar em dois projetos hidrelétricos”, disse Ana Terezinha Carvalho, a analista de pessoal da Marquise, uma companhia de Porto Velho. A cidade fica no alto da bacia amazônica, onde o Brasil emprega milhares para construir duas grandes represas, chamadas Jirau e Santo Antônio.
A sra. Carvalho disse que a companhia dela rapidamente contratou 37 haitianos que chegaram no ano passado, para coletar lixo em Porto Velho e levar até o aterro sanitário. Alguns ganham mais de 800 dólares por mês, num trabalho que inclui seguro de saúde, hora extra e feriados pagos. “Não havia brasileiros, ficamos felizes ao contratar haitianos”, ela disse.
As autoridades estimam que cerca de 500 haitianos vivem em Porto Velho e cerca de 700 em Manaus, a maior cidade brasileira na Amazônia. Centenas de outros chegaram a São Paulo, a capital econômica do Brasil. Companhias como a Fibratec, um fabricante de piscinas do estado de Santa Catarina, enviaram gerentes até aqui para contratar dezenas de haitianos.
Além de atender a demanda por trabalho baraoa, o empenho em permitir que haitianos trabalhem no Brasil demonstra a ambição do país em ter maior influência regional, ao tentar aliviar os problemas da nação mais pobre do hemisfério.
Desde 2004, o Brasil manda tropas para liderar a missão de paz das Nações Unidas no Haiti. Mas agora há mais haitianos no Brasil do que soldados brasileiros no Haiti. Em setembro, o Brasil anunciou que ia começar a reduzir o número de seus soldados — 2 mil — na nação caribenha.
A maioria dos haitianos espera passar algumas semanas no limbo da imigração em Brasiléia, antes de seguir viagem. Alguns, como Francisco Joseph, de 25 anos, aproveitam seu tempo aqui. Ele compra cartões de celular pré-pago atravessando a ponte até Cobija, na Bolívia, e os vende aos haitianos que ficam na praça de Brasiléia com 30 centavos de dólar de lucro por cartão. Ele ganha até 10 dólares por dia.
“Esse pouquinho de dinheiro me dá um pouquinho de dignidade”, ele diz.
Outros, como Jacksin Etienne, 31, tem sonhos maiores. Um poliglota que passa facilmente do inglês para o espanhol, deste para o francês e em seguida para o creole, o sr. Etienne diz que espera trabalhar como tradutor em um hotel.
“Quero ir direto para São Paulo, a Nova York da América do Sul”, ele diz. “O Brasil está em ascensão e precisa de gente como eu”.
Lis Horta Moriconi and Erika O’Conor contributed reporting from Rio de Janeiro.
PS do Viomundo: Eu não sei se o dado é real, mas fico imaginando o cara lá de Wisconsin lendo na primeira página do New York Times que a renda dos mais pobres subiu sete vezes mais que a dos mais ricos no Brasil…