quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O BÊBADO E O CRONISTA

Certo dia, andando pelo movimentado calçadão de Copacabana me deparo com uma cena um tanto quanto curiosa: ali sentado sobre o banco, a conhecida estátua de Drummond, o que já é “natural” da paisagem. Todavia, ao seu lado estava uma figura bem peculiar, de vestimentas comuns o costume carioca e praiano de ser, mas notava-se que era de se questionar a sobriedade do sujeito – abraçado a “Drummond”, conversava amigavelmente, mas com movimentos e falas lentas e embaralhadas...
Diante do cenário, me coloquei a observar e era possível imaginar um diálogo entre eles, “o bêbado e o cronista” (não mais o equilibrista de Elis Regina). O encontro do bêbado e o poeta em pleno ano de 2010 em Copacabana, poderia acontecer mais ou menos assim:
Drummond começaria a conversa, perplexo diante da nova, e também reprodutora, condição humana.
_E agora, José?
_“Eita”! Como saaaabe meu nomee? “Vixi”! Será que me esqueci de pagar a pinga?
_Não, na verdade, José é o homem, o humano que tem passado por tantos conflitos e inverdades por conta de tropeços históricos, políticos e ideológicos.
_Ah! Nãããoooo me diga que o senhor também tropeçou? Eu, sim. Sabe? Tinha uma pedra, um pedregulho no meio do caminho. Ééééééé isso aí, no meio do caminho tinha uma pedra e... puft, tropecei. Mas, na real – continua ele em tom de cochicho – parecia minha “mulhé”, uma pedra no cami-mi-mi-nho.
_ As pedras fazem parte da viagem e descobertas do mundo. Sou de Itabira, de Belo Horizonte, do Rio de Janeiro, mas na Balada do amor através das idades, eu era grego e ela troiana. Quando terminadas essas viagem ao redor da Terra e além desta, nos resta colonizar, civilizar e humanizar o homem. O senhor já fez esta viagem?
_ Ainda que mal consigaaa lhe entender, o senhor quer saber se já viajei? Olha, até que siimmm, mas nada muito longe. Fui até aliiii, ihhh nem sei mais o nome, mais fica a umas 5, 6, 7, não, não, umas 8 horas daqui.
_ Eu também já fui brasileiro, hoje sou somente humano e proclamo que precisamos descobrir o Brasil, faço o verdadeiro Hino Nacional.
_ Ééééééééé. Mas, voltaanndo a minha “mulhé”, acho que vai acabar em divórcio, não acha nãooo? É só brigaaaa, guerra.
_ Não. A guerra é sempre feita entre um que quer e outro que não quer brigar. Quando os dois querem, verificam que estão de acordo, e detestam-se em paz. Use a canção para ninar mulher; uma canção amiga.
_ Estes só podem ser conselhos de um apaixonaaaadoooo. Eita, homem, tá amando, heim? Deve ter razão, vou separar não, ela me atuuuura. Não atuura?
_Os ombros suportam o mundo, a eles não pesam mais que as mãos de uma criança. Suportar é também com o outro, que é tão outro de você, mas mesmos juntos não podemos perder de vista a liberdade humana.
_ Liber-da-de... olhe, as vezes fico pensandooo nisso, sabe? Todo mundo diz na TV, nas músicas, nessas revistas famosas e jooornais. Tooodooo mundo é livre. Não seiiii nãooo. Eu tenho que “trampá”, pagar contaaa, e ainda ouvir minha “mulhééé”...
_ Meu caro, estas são as sete faces da liberdade. Se ela é dos homens, se foi dada por Deus, não me cabe responder. Da liberdade digo que simplesmente é não se diz, afinal. Já Deus... ele é quem não acredita em mim... Esse é um tema bem polêmico, não é mesmo senhor? Senhor? Senhor...
_ ...
_ Agora que a prosa estava ficando boa...

O “bêbado” adormece no banco e Drummond continua com suas reflexões, agora solitárias, prestes a escrever uma nova poesia, ou crônica quem sabe, acerca daquele encontro tão incomum.
Quanto a mim, expectadora, o que posso dizer depois deste curto diálogo?
“O ministério da saúde adverte: beba com moderação. A bebida em excesso pode causar alucinações dentre outras reações adversas.”
Mas até que neste caso específico não seria tão infecunda assim a alucinação... pode até evitar divórcios!


Por Juliana Janaina Tavares Nóbrega

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